quinta-feira, 3 de abril de 2014

Sem título: o tempo que passo no facebook não me permite pensar nisso

Sento-me para escrever sobre as declarações da Isabel Jonet e tenho dificuldades em começar. O asco que tal figura me causa tolhe-me o espírito. 
Não sou capaz de reagir com a seriedade científica com que vi alguns comentarem a triste verborreia. Dizem que Isabel Jonet não tem razão porque a grande maioria das oportunidades de emprego estão em fóruns online. Não contesto que tenham razão, não desconsidero o seu contributo para a discussão. Mas a contestação que a Isabel Jonet me merece não é do plano da ciência. É do plano moral. É nesse plano que combato tudo aquilo que Isabel Jonet representa. 
Não me lembro se assinei ou não a petição que pedia a demissão de Isabel Jonet do cargo de Presidente do Banco Alimentar. Lembro-me bem, isso sim, da revolta que me causaram aquelas declarações, das discussões ferozes que tive por causa delas e de ter tido a certeza que dali nada se podia esperar de bom. Seguiu-se uma entrevista em que Isabel Jonet dizia preferir a caridade à solidariedade. Queixava-se de ter sido mal interpretada na entrevista à SIC. Mas não perdia a oportunidade de fazer das suas de novo. 
Andou afastada e não tínhamos saudades. Mas na terça-feita veio a terreiro acusar os desempregados de passarem demasiado tempo agarrados às redes sociais, as suas maiores inimigas. 
O problema não está nas declarações em si. Está na concepção que lhes está subjacente e que representa o pior que a caridade nos oferece. 
Isabel Jonet é Presidente do Banco Alimentar. Presta a muitos necessitados um serviço de inquestionável valor. E acha que em função disso os pobrezinhos que ajuda são propriedade sua. Que sobre tudo o que se passa na vida deles pode opinar. Mais! Acha que lhes pode prescrever as condutas dignas de um pobrezinho que se preze. Não devem comer bifes, nem lavar os dentes com a água a correr (Como fazem os seus filhos. De resto, por serem seus filhos parece não fazer mal.), não devem ir a concertos e, sabemos agora, não devem perder muito tempo no facebook. 
Há uma bitola que pobre que é pobre tem de preencher para ser digno da ajuda que a magnânima Isabel Jonet, do alto da sua bondade e da sua superioridade moral, concede. Só assim não se deverá sentir culpado por ser pobre. Só assim será digno da esmola que recebe. 
As declarações sobre a inexistência de miséria em Portugal e sobre a irresponsabilidade dos pais que deixam as crianças irem para a escola com fome falam por si. 
Isabel Jonet é a afirmação do pior que a caridade comporta, é por isso que ambas têm de ser contestadas. 
A luta continua. Contra a fome e contra muito mais do que isso. 

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